Cidadão
(Lucio Barbosa)
Tá vendo aquele edifício moço?
Ajudei a levantar
Foi um tempo de aflição
Eram quatro condução
Duas pra ir, duas pra voltar
Hoje depois dele pronto
olho pra cima e fico tonto
Mas me chega um cidadão
e me diz desconfiado, tu tá aí admirado
ou tá querendo roubar?
Meu domingo tá perdido
vou pra casa entristecido
Dá vontade de beber
E pra aumentar o meu tédio
eu nem posso olhar pro prédio
que eu ajudei a fazer
Tá vendo aquele colégio moço?
Eu também trabalhei lá
Lá eu quase me arrebento
Pus a massa fiz cimento
Ajudei a rebocar
Minha filha inocente
vem pra mim toda contente
Pai vou me matricular
Mas me diz um cidadão
Criança de pé no chão
aqui não pode estudar
Esta dor doeu mais forte
por que que eu deixei o norte
eu me pus a me dizer
Lá a seca castigava mas o pouco que eu plantava
tinha direito a comer
Tá vendo aquela igreja moço?
Onde o padre diz amém
Pus o sino e o badalo
Enchi minha mão de calo
Lá eu trabalhei também
Lá sim valeu a pena
Tem quermesse, tem novena
e o padre me deixa entrar
Foi lá que Cristo me disse
Rapaz deixe de tolice
não se deixe amedrontar
Fui eu quem criou a terra
enchi o rio fiz a serra
Não deixei nada faltar
Hoje o homem criou asas
e na maioria das casas
Eu também não posso entrar
Lua Curiosa
(Zé Geraldo / Cacá Bloise / Tavares Dias)
Moro naquela casinha
na beirada da lagoa
lá no pé do cafezal
Onde o Criador na alvorada
ensaia a passarinhada
num grande coral
Quando é bem de tardezinha
eu mais a morena minha
dá de namorar
E é coisa tão maravilhosa
que a lua curiosa
vem logo espiar
Peão do Trecho
(Zé Geraldo)
Pode deixar mulher que eu levanto cedo e vou fazer o café
Levo procê na cama
eu já tô no pé
O dia chega,
eu me mexo
eu vou cair no trecho
e rodo enquanto der
Nosso destino aponta pra onde Deus quer
Se preocupa não
Das madrugadas nós sabemos onde ir e vir
Por um bom preço se pode sorrir
Mesmo aos trancos e barrancos bela companheira
Quantas noites e nós por aí
trafegando pela marginal
Sem largar o corrimão da estrada
Uma parte do mundo é nossa morada
A outra parte é nosso quintal
Senhorita
(Zé Geraldo)
Minha meiga senhorita
eu nunca pude lhe dizer
Você jamais me perguntou
de onde eu venho e pra onde vou
De onde eu venho não importa,
já passou
O que importa é saber
pra onde vou
Minha meiga senhorita
o que eu tenho é quase nada
Mas tenho o sol como amigo
Traz o que é seu
e vem morar comigo
Uma palhoça no canto da serra
será nosso abrigo
Traz o que é seu
e vem correndo, vem morar comigo
Aqui é pequeno
mas dá pra nós dois
E se for preciso
a gente aumenta depois
Tem um violão que
é pra noites de lua
Tem uma varanda
que é minha e que é sua
Vem morar comigo
meiga senhorita
Vem morar comigo
Doce e meiga senhorita
Vem morar comigo
Como Diria Dylan
(Zé Geraldo)
Hei você que tem de 8 a 80 anos
Não fique aí perdido como ave sem destino
Pouco importa a ousadia dos seus planos
Eles podem vir da vivência de um ancião
ou da inocência de um menino
O importante é você crer
na juventude que existe dentro de você
Meu amigo meu compadre meu irmão
Escreva sua história pelas suas próprias mãos
Nunca deixe se levar por falsos líderes
Todos eles se intitulam porta vozes da razão
Pouco importa o seu tráfico de influências
Pois os compromissos assumidos quase sempre ganham subdimensão
O importante é você ver o grande líder que existe dentro de você
Meu amigo meu compadre meu irmão
Escreva sua história pelas suas próprias mãos
Não se deixe intimidar pela violência
O poder da sua mente e toda sua fortaleza
Pouco importa esse aparato bélico universal
Toda força bruta representa nada mais do que um sintoma de fraqueza
O importante é você crer nessa força incrível que existe dentro de você
Meu amigo meu compadre meu irmão
Escreva sua história pelas suas próprias mãos
Bolo de Aniversario
(Aroldo Santarosa)
Hoje mais que tudo eu queria ter
uma parte desse bolo que pudesse ser
apagada com um sopro simplesmente
Vem latente essa vontade de viver
Hoje mais que tudo eu vou ver passar
uma folha dessa história que eu não sei contar
E passou foi como um sopro simplesmente
É estranha a condição de medo e gente
Hoje mais que tudo eu vou mastigar
um pedaço desse medo que eu não sei cortar
e sentir o amargo e doce desse creme
numa estranha confusão de bolo e gente
Semente de Tudo
(Zé Geraldo)
Eu sou o atalho de todas as grandes
estradas por onde passei
Das vilas pequenas cidades
por onde andei
Herança de casos passados
Migalhas do pão consumido
Eu sou a metade de tudo que você tem sido
Nas ruas num sol de dezembro
eu sou o farol e a contra mão
Da flor que carregas no peito
Simples botão
Sou parte maior desse germe
que prolifera e contamina
Querendo construir morada
em você menina
Doce menina
Eu sou uma parte do pó
Que compõe a estrada de terra
Você é água cristalina
lá no pé da serra
Retalhos de noites vividas
num albergue, pensão ou motel
mostrando caminho seguro
Um jeito de céu
Eu sou uma parte da noite
que entra no dia
no alvorecer
Você é a semente de tudo
Eu vivo a partir de você
Rio Doce
(Zé Geraldo)
Deposito em suas águas o meu grande segredo
Parto pra cruzar fronteiras
Engrossar fileiras
Compor meu enredo
Deixo suas margens ricas sob a sombra lírica da ibituruna
Una pobre sabiá que perdeu seu canto de frases ligeiras
Por ver se apagar
A ilusão ardente
tão inconsequente da paixão primeira
Oh meu rio doce
Doce são os seios
Da morena flor
Flor do seu ipê
Que vive sob as gameleiras
Pés de genipapo junto de você
Leva essa morena no seu leito manso
faz o seu remanso se vestir de azul
Que eu tô levando a minha mocidade
pras velhas cidades e praias do sul
Meu Caminho de Nuvens Brancas
(Zé Geraldo)
Um bando de jovens abrindo as manhãs
São brancos, são negros, são todos iguais
Tal qual um pomar onde as frutas se encontram
Se cruzam fecundas, se tornam casais
A manhã se encontra com o entardecer
É um sorriso na boca, do céu feito cor
Um só prato alimenta o lobo e a ovelha
É a graça que marca os dias de amor
Olhando as pessoas com olhos de anjo
o louco se sente um feliz animal
Tão livre, tão solto, tão puro, tão leve
Despido do medo, da ira e do mal
É que as mãos do amor são brancas, macias
Assim como os lírios que brotam do chão
Não há quem abriu a cortina do peito
Que tenha esquecido a cor da paixão
Meu caminho de nuvens brancas
Meu caminho de nuvens brancas
Milho aos Pombos
(Zé Geraldo)
Enquanto esses comandantes loucos
ficam por aí queimando pestanas
organizando suas batalhas
Os guerrilheiros nas alcovas
preparando na surdina
suas bombas e suas mortalhas
A cada conflito mais escombros
Isso tudo acontecendo
e eu aqui na praça
dando milho aos pombos
Entra ano, sai ano, cada vez
fica mais difícil o pão, o arroz,
o feijão, o aluguel
Uma nova corrida do ouro
o homem comprando da sociedade o seu papel
Quando mais alto o cargo maior o rombo
Isso tudo acontecendo
e eu aqui na praça
dando milho aos pombos
Eu dando milho aos pombos
no frio desse chão
Eu sei tanto quanto eles
se bater asas mais alto
voam como gavião
Tiro ao homem
Tiro ao pombo
Quanto mais alto voam
maior o tombo
Eu já nem sei o que mata mais
Se o trânsito, a fome ou a guerra
Se chega alguém querendo consertar
vem logo a ordem de cima
Pega esse idiota e enterra
Todo mundo querendo descobrir
seu ovo de Colombo
Isso tudo acontecendo
e eu aqui na praça
dando milho aos pombos
Aroldo Santarosa: guitarra sintetizadora e vocal
Luizão Bueno: guitarra e violão 6
Fernando Melo: baixo e violão 12
Duda Neves: bateria
Zé Geraldo: violão e gaita
Participações especiais:
Vera Campos e Paulinho Campos - Vocal
Agradecimento:
Paulão - Paraíso dos Loucos, Sandro Led Slay, Ney/Rose, Estúdio Ensaio 864 (Nenê, Cacá e toda a moçada - grande força), Juan, Carminha, Bete/Betânia/Laerte, Beto/Luiz/Wagner, Vera/Paulinho, Nilson/Ulisses, Abel, Luisa/Marcio/Almir (grande encontro), Aroldo/Luizão/Fernando/Duda (grandes momentos), Pedro Castro, João Paulo (1 e 2), Adenor e todo o pessoal do SESC Pompéia, Grande/Norberto, Ronaldo e Coral de Rodeiro, Claudio Lucci e moçada do Camerati/Santo André. Marcão/Darcio - as portas do coração estão abertas